Análise da fluoretação da água no estado de São Paulo indica que cerca de 30% das amostras estão inadequadas
11/08/2015 às 13:50
Levantamento é o mais
amplo já realizado no mundo
Os riscos à saúde da
população incluem fluorose dentária e a não proteção contra cárie
São Paulo, agosto de 2015 – O Conselho Regional de
Odontologia de São Paulo (CROSP), o Centro Colaborador do Ministério da Saúde
em Vigilância da Saúde Bucal (CECOL/USP) e o Laboratório de Bioquímica da
Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Unicamp (FOP/UNICAMP) concluíram as
análises do mais amplo levantamento já realizado no mundo sobre a fluoretação
das águas. O estudo verificou as águas de mais de 98% dos 645 municípios de São
Paulo, e concluiu que 30% estão com níveis inadequados de flúor, ou seja, três
em cada dez amostras coletadas não atendem ao parâmetro de obtenção do máximo
de benefício anticárie com o mínimo de risco de fluorose dentária.
O flúor vem sendo usado no mundo há 60 anos e é recomendado
pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pela Organização Pan Americana de
Saúde e pelo Ministério da Saúde. O CROSP também defende a sua aplicação na
dosagem correta, pois seu excesso ou falta são prejudiciais. “A correta
quantidade de flúor aplicada na água combate a formação de cárie. Teores de flúor
baixos não reduzem cárie. Teores altos, por sua vez, são igualmente
prejudiciais, podendo levar a uma fluorose”, defende o Presidente do CROSP,
Cláudio Miyake.
Se considerado o padrão adotado pela Secretaria de Estado da
Saúde de São Paulo, balizado pela resolução SS-250 (de 1995), as concentrações
em uma faixa de 0,6 a 0,8 são tidas como apropriadas. Abaixo ou acima deste
recorte, são inadequadas e podem favorecer a formação de cárie ou propiciar a
fluorose, respectivamente.
Já pelo padrão CECOL, referencial mais recente e considerado
por diversos especialistas um modelo atualizado para este tipo de mensuração, a
classificação do teor do flúor na água não é dividida apenas em “adequada” ou
“inadequada”, como proposto pela resolução SS-250. Os parâmetros considerados
são “benefício” ou “risco”. Ou seja, o teor de flúor na água pode beneficiar a
prevenção da cárie e/ou representar risco de ocorrência de fluorose.
Na análise, pelo padrão SS-250, 71,5% das amostras de água
estão adequadas, 14,5% estão abaixo da concentração recomendada e 14% estão
acima. Quando as águas com concentração abaixo do ótimo são analisadas pelo
referencial do CECOL/USP em termos de benefício/risco, 4,9% foram classificadas
como mínimo/baixo e 9,2% como insignificante/insignificante. Logo, 9,2% das
amostras de água não conferem proteção à cárie, quer seja para crianças como
para adultos. Por outro lado, quando as amostras com teor de flúor acima do
nível recomendado são analisadas em termos do binômio benefício/risco, 11,9%
delas foram classificadas como máximo/moderada, 1,8% como questionável/alto e
1,1% como malefício/muito alto. Assim, 1,1% das amostras de água são
consideradas de alto risco em termos de provocar uma fluorose dental
esteticamente comprometedora se ingeridas regularmente por crianças durante a
formação dos dentes. Nesse 1,1% de amostras de águas foram encontradas
concentrações de íon flúor acima de 1,5 ppm, o valor máximo permitido (VMP)
pelo Ministério da Saúde.
As cidades que em todos os pontos e nos 3 tempos de coleta
apresentaram concentrações de fluoreto sem benefício anticárie (<0,4 ppm F)
foram: Altinópolis, Analândia, Boa Esperança do Sul, Guatapará, Ipeuna, Luis
Antonio, Morro Agudo, Nuporanga, Orlandia,
Pirajuí e Rio das Pedras. Já, os municípios com concentração de fluoreto
preocupante em termos de fluorose (>1,4 ppm F) foram: Cesário Lange e
Pereiras.
Problemas de irregularidade da fluoretação em alguns pontos
de coleta de algumas cidades e em alguns períodos também foram encontrados e
serão objeto de análise posterior. Já São Paulo, Campinas e Sorocaba estão com
os índices de acordo, mas isso não ocorre somente em municípios de grande
porte, cidades como Jaboticabal, Dourado, Fartura e Macatuba também estão com a
quantidade adequada.
O CROSP participa da iniciativa com o envolvimento direto de
cerca de 50 fiscais que, criteriosamente, identificaram, em quase um ano de
trabalho, as localidades, suas fontes de abastecimento e os pontos para a então
coleta de materiais. O CECOL/USP responde pela metodologia empregada. A
FOP/UNICAMP, pelas análises laboratoriais.
Essa é a primeira vez que um estudo desse tamanho é realizado
no mundo, o censo da fluoretação da água de uma população de 45 milhões de
pessoas. No Brasil, as análises até então eram restritas apenas aos municípios
com mais de 50 mil habitantes. Em São Paulo, isso resultava em pouco mais de
100 locais, deixando 80% das cidades de fora. “Sem esse estudo, teria sido
impossível saber o resultado de algumas cidades, e isso era preocupante, pois
sabemos por experiência que quanto mais baixo o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) e menor a população, a saúde bucal é mais precária e o uso correto
do flúor é ainda mais necessário”, afirma o Presidente do CROSP.
“A apuração honrou a assinatura de um termo de compromisso
entre o CROSP, o CECOL e a UNICAMP firmado em 2013”, afirma o Prof. Jaime Cury.
“No levantamento anterior, divulgados no ano passado, foram cobertos 105
municípios e os resultados negativos comunicados, por ofício emitido pelo
CROSP, a cada uma das cidades”, completa Cury.
“Um levantamento desta natureza, que indica caminhos
concretos para o benefício da saúde da população, dentre muitos outros
desdobramentos, compeliu o grupo a buscar mais do que um critério para a
avaliação das análises”, explica o Prof. Dr. Paulo Frazão, membro da
Coordenaçãodo CECOL da USP. “Desta forma, o grupo de pesquisadores decidiu
fazer a apuração também pela ótica de um consenso técnico do CECOL de 2011,
fruto de uma reflexão mais recente e considerado por diversos especialistas um
modelo mais apropriado para este tipo de avaliação”, ressalta o Professor.
O Projeto de Lei (PL) nº6359, que tramita na Câmara dos
Deputados desde 2013, propõe a revogação da Lei nº 6.050, de 24/05/1974, que
determina a obrigatoriedade da fluoretação da água em sistemas de abastecimento
quando existir estação de tratamento. “A aprovação desse Projeto seria um
retrocesso na prevenção da cárie dentária no estado de São Paulo, que conta com
um dos melhores sistemas de prevenção dessa doença em todo o País, desde os
anos 1980”, afirma o Secretário do Conselho Regional de Odontologia de São
Paulo, Marco Antonio Manfredini.
Nas últimas quatro décadas os níveis de cárie dentária
registraram um declínio importante no estado de São Paulo, principalmente em
crianças. Entre as medidas de prevenção responsáveis pela melhora da situação
estão os cremes dentais fluoretados e a fluoretação das
águas. Antes da adição de flúor aos cremes dentais e à água,
uma criança de 12 anos de idade tinha, em média, 8 dentes atingidos pela
doença. Atualmente esse número não ultrapassa 2 dentes.